Na cidade do sonho, que existe dentro da outra e onde o tempo é um novelo inextrincavelmente emaranhado pelos gatos, quase sempre avisto ao longe, dobrando uma esquina, aquele mesmo vulto silencioso. Não sei por que ele me espiona e evita-me. Desconfiará que sou acaso a sua imagem perdida nos espelhos? Vou fazer fumigações, acender velas pretas a São Cipriano, velas brancas ao meu Negrinho do Pastoreio, velas de todas as cores a São Jorge em seu belo cavalo – e, uma noite, numa esquina do sonho, hei de enfim surpreendê-lo, cara a cara!
Mas talvez nunca mais eu despertasse...
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(O Outro, integra o livro Na Volta da Esquina, de Mário Quintana, Coleção RBS, Editora Globo, 1979, p. 75.)
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Nossa...
ResponderExcluirQue maravilha!
A profundidade é tanta, que a gente visualiza e sente na pele.
Beijos.
Há quem sinta as coisas da vida, tudo tão simples e tão complexo, duma forma extraordinária, fora do comum, do vulgo, na azáfama da sobrevivência do dia a dia...
ResponderExcluirSabe bem ler e ouvir estas pessoas. Sabe bem e faz muito melhor às nossas vidas, cada um de nós a entrelaçar os seus sentimentos com os dos outros.
Precisamos de pessoas assim, que partilhem connosco o seu modo de escolher caminhos de vida com esta noção de uso atempado do tempo...
Um abraço, Pedro